sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

A quem mete medo o Chile?

Uma das questões que mais celeuma tem levantado na discussão pública deste modelo de avaliação de desempenho de professores é o facto de, supostamente, ele ter sido importado do Chile. Um modelo vindo do Chile (isto é, de um país não-europeu!), conhecido por ter sido um laboratório, nos anos 70, do neo-liberalismo – entrelaçado num sistema político autoritário liderado por Pinochet seria, dizem-nos, inadmissível.

Ora, há aqui pelo menos três falsidades que importa desfazer:

(1) Se dermos uma olhada pelo relatório Teachers Matters da OCDE (2005), vemos que o modelo do Chile é apontado como um exemplo de boas práticas. As imagens seguintes reproduz uma box do relatório citado (págs.192-3), e no qual o modelo de avaliação de desempenho docente chileno merece destaque positivo.

























(2) O modelo português não foi “copiado”, porque não é de todo idêntico, mesmo que haja semelhanças. Para quem quiser ver, explore o site chileno relativo à avaliação de desempenho docente. Por exemplo, vemos imediatamente que os municípios têm um papel central na condução do processo - algo que está longe de acontecer no modelo português.

(3) Outra 'barbaridade' que se lê por aí é a associação deste modelo ao governo de Pinochet. Ora, o modelo foi implementado no ano de 2003 por um governo de coligação de centro-esquerda, então liderado por Ricardo Lagos. Foi, aliás, nesta legislatura que o Ministério da Educação chileno alargou a escolaridade obrigatória até aos 18 anos, o que faz do Chile uma excepção na América Latina na responsabilidade assumida pelo Estado na educação (como se pode ler aqui). Esta mesma coligação de centro-esquerda é hoje liderada por Michelle Bachelet, cujo actual programa de governo promete universalizar a guarda de crianças entre os 2 e os 5 anos.
Ou seja, qualquer associação deste modelo de avaliação – e já agora, do(s) governo(s) de Lagos (e Bachelet) - a um governo autoritário ou neo-liberal é pura má fé. Atitude a que, nesta discussão, já vamos estando habituados.

Por fim, vale a pena lembrar que, se o modelo chileno aparenta ser mais complexo e exigente do que o de muitos países europeus, é porque é um modelo recente, que incorpora ideias actuais resultantes da investigação nesta área (sabemos que é mais fácil criar um modelo do zero do que mudar modelos implementados há 2 ou mais décadas, cristalizados no tempo e nas instituições, e isso pode ajudar a perceber porque outros países europeus não tenham ainda mudado os seus sistemas no sentido de lhes conferir uma maior exigência). E isto é uma vantagem do modelo chileno, não uma desvantagem.